29/08/2020

Manifesto: A saúde da mulher é um direito!

Elaborado por CFEMEA.

Poucos dias após as mobilizações para garantia de direitos de uma menina de 10 anos, para acessar o aborto legal, as mulheres estão sendo novamente atacadas através da Portaria 2282/GM/MS lançada ontem pelo Ministério da Saúde. Que põe em risco nossas vidas, criminaliza as vítimas e dificulta o acesso aos serviços de saúde.

Entendendo a Portaria Nº 2.282, de 27 de Agosto de 2020, que dispõe sobre o Procedimento de Justificação e Autorização da Interrupção da Gravidez nos casos previstos em lei, no âmbito do Sistema Único de Saúde – SUS

A portaria é uma retaliação política do governo federal em resposta às movimentações da sociedade e dos serviços de saúde para proteger a vida e os direitos da menina de 10 anos, que chocou a sociedade brasileira ao revelar sua gravidez, resultante do estupro que sofria por parte de um tio desde os 6 anos de idade. A portaria não menciona normas do próprio Ministério da Saúde que tratam do tema e não faz referência à Lei 12.845/2013, que dispõe sobre o atendimento obrigatório e integral de pessoas em situação de violência sexual.

Estamos novamente diante de uma argumentação antiga, de representantes conservadores e fundamentalistas, com um projeto nítido: inviabilizar a normas técnicas do próprio Ministério da Saúde, que orientam um atendimento humanizado ao abortamento e a prevenção e o tratamento dos agravos resultantes da violência sexual contra crianças e adolescentes. Normas estas aprovadas no final dos anos 90 e início de 2000 e atualizadas em diferentes reedições.

Desde então, lidamos com tentativas constantes dos grupos antidireitos das mulheres de impor condicionantes no campo legal, barreiras visando impedir o acesso aos serviços, ao atendimento, criminalizando os/as profissionais de saúde, bem como as mulheres, e familiares (no caso de atendimento das crianças). Os fundamentalistas querem dificultar ou mesmo inviabilizar o acesso ao aborto legal, direito já garantido em lei desde 1940.

Podemos lembrar de um destes momentos com o PL 5069/2013, que então o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, tentou aprovar. Essa iniciativa continha teor semelhante, de mais uma vez impedir acesso aos serviços obrigatórios de atendimento integral e humanizado às pessoas em situação de violência sexual. Tal momento, desencadeou uma forte reação das mulheres com a Primavera Feminista de 2015. É a pauta de sempre retomando! Mas não nos calaremos diante de um governo autoritário e misógino, que não suporta a autonomia das mulheres, para decidir sobre a interrupção ou não de uma gravidez, mesmo em um caso extremado de dor e violação, como o caso dessa criança de 10 anos, fato que alarmou e chocou toda a sociedade brasileira.

A Portaria proposta dificulta o acesso ao aborto legal, burocratiza e leva a delegacia para dentro dos serviços de saúde:

• Torna obrigatória a notificação à autoridade policial pelo médico, demais profissionais de saúde ou responsáveis pelo estabelecimento de saúde que acolheram a paciente dos casos em que houver indícios ou confirmação do crime de estupro. (É o mesmo objeto do PL 5069/2013, que nos levou às ruas contra o Cunha/Primavera Feminista). Para a notificação, profissionais devem manter os indícios do crime;

• A portaria também muda o Procedimento de Justificação e Autorização da Interrupção da Gravidez nos casos previstos em lei (já previsto pelas normas atuais) que passa a ter QUATRO FASES. Todas a serem registradas no formato dos termos anexos à portaria, arquivados anexos ao prontuário médico e com garantia de confidencialidade.

• Fase 1: Relato circunstanciado do evento, realizado pela própria gestante, perante 2 (dois) profissionais de saúde do serviço e assinado por essas 3 pessoas (ou representante legal, se ela for menor de idade);

• Fase 2: Parecer técnico do médico com base nos exames realizados. Mas este depende da concordância de uma equipe de saúde multiprofissional, que subscreverão o Termo de Aprovação de Procedimento de Interrupção da Gravidez, não podendo haver desconformidade com a conclusão do parecer técnico. Essa equipe deve ser composta por obstetra, anestesista, enfermeiro, assistente social e/ou psicólogo.

• Nesse momento, a equipe médica deverá informar acerca da possibilidade de visualização do feto ou embrião por meio de ultrassonografia, caso a gestante deseje, e essa deverá proferir expressamente sua concordância, de forma documentada.

• Fase 3: assinatura da gestante ou representante do Termo de Responsabilidade. O termo que conter advertência expressa sobre a previsão dos crimes de falsidade ideológica (art. 299 do Código Penal) e de aborto (art. 124 do Código Penal), caso não tenha sido vítima do crime de estupro.

• Fase 4: assinatura da gestante ou representante do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Na ocasião, a gestante vai ser informada de todos os procedimentos que serão realizados.

NossaPalavraBasta

VítimaNãoÉSuspeita

SaudeDaMulherÉDireito

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