26/01/2021

COVID-19: vozes negras exigem vacina e atenção às comunidades quilombolas

No início da vacinação no país, cabe a nós exigir prioridade no atendimento das comunidades quilombolas, localizadas distantes de hospitais e sem acesso a políticas públicas

“Estou muito orgulhosa disso. Mulher, negra, primeira a ser vacinada. Vamos nos vacinar, não tenham medo.” Na cerimônia que marcou o inicio da tão aguardada vacinação contra a Covid-19 no Brasil no dia 17 de janeiro, a declaração corajosa da enfermeira Mônica Calazans também nos encheu de orgulho.

Consciente da simbologia desse momento para a história recente do país, Mônica fez questão de enfatizar sua condição de mulher negra e de representante de uma das parcelas da população mais vulneráveis aos efeitos econômicos, sociais e sanitários da pandemia.

Segundo boletim epidemiológico do Ministério da Saúde que analisou casos até 12 de dezembro, entre hospitalizados pela doença 209.034 são negros, enquanto 202.482 são brancos. Negros também morrem mais em decorrência do vírus: são 74.949, enquanto  62.993 são brancos. Sabemos, inclusive, que essa população também está exposta a comorbidades mais intensas, tais como hipertensão, diabetes e anemia falciforme.

Vale lembrar que 5,4% dos casos não possuem a informação de raça registrada – algo que só passou a acontecer depois de pressão de organizações como a Coalizão Negra por Direitos, da qual Criola é cofundadora.

É fato que a situação é mais crítica para mulheres negras e pessoas periféricas, um padrão que se explica por desigualdades sociais e pelo racismo estrutural. Afinal, quem não pode deixar de trabalhar, usar transporte público e se expor de maneira geral aos riscos da contaminação? Quem é mais exposto a precárias condições sanitárias e de atendimento à saúde?

Se o início da vacinação é um alento para os brasileiros, também cabe a nós exigir prioridade no atendimento a essa parcela vulnerável da população. É o caso das comunidades quilombolas, localizadas distantes de hospitais e excluídas de acesso a políticas públicas. Esses grupos têm sistematicamente denunciado a subnotificação de casos de Covid-19 e a ausência do Estado, como vem destacando a Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq). Por isso, temos cobrado, por meio de redes como o Observatório Direitos Humanos Crise e Covid-19, diretrizes de vacinação para a proteção desses grupos.

Pelo Plano Nacional de Operacionalização de Vacinação contra a Covid-19, os quilombolas começariam a ser vacinados após a fase 3, ao longo de 12 meses. É tempo demais. Sem contar que cada Estado tem desenvolvido suas próprias listas. São Paulo, por exemplo, acaba de retirar essa população do grupo prioritário máximo. A situação do Rio de Janeiro estava bem pior, uma vez que as comunidades quilombolas nem entraram no plano estadual de imunização divulgado em dezembro.

Não podemos esperar nem permitir que o único plano do governo siga sendo o da atual necropolítica, quando o Estado decide quem deve viver e morrer. Resistiremos!

Foto: Vrin Resende – Midia NINJA

*Artigo divulgado no site Brasil de Direitos.

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