16/05/2022
Criola denuncia racismo e ilegalidades cometidas pelo Estado na manutenção de prisões provisórias de mulheres negras
Campanha “A dignidade não é provisória” alerta sociedade sobre impactos permanentes na vida de mulheres negras mantidas no cárcere injustamente
As prisões provisórias, que correspondem a quase um terço dos encarceramentos no Brasil, vêm sendo usadas de maneira ilegal e vitimando especialmente mulheres negras e suas famílias. Denunciar as ilegalidades cometidas pelo Estado ao manter esse grupo preso em condições desumanas, perpetuando violências, reduzindo saúde e justiça a despeito das legislações nacionais e acordos internacionais é o objetivo da campanha “A dignidade não é provisória”, realizada por Criola com apoio de grupos que lutam pelos direitos dessa população. O lançamento ocorre dia 17 de maio nas redes sociais (@ongCriola) com a hashtag #AdignidadeNãoéProvisória, em tuitaço às 10h para pressionar autoridades das três esferas de poder.
Ao longo de 4 semanas, a campanha informa sobre a situação de super encarceramento decorrente do racismo institucional e estrutural na sociedade, que mantêm mulheres negras presas sem ao menos condenação, por pequenos crimes sem violência ou grave ameaça e longe de suas famílias, comunidades, trabalhos, estudos e de outros direitos. Outro grave problema denunciado é o descumprimento da Lei 13.769, originada do Habeas Corpus coletivo 143.641. A legislação, aprovada em 2018, aplicada à crimes cometidos sem violência ou grave ameaça, garante direito às medidas cautelares menos graves do que a prisão para gestantes, puérperas, mães ou pessoas responsáveis por crianças de até 12 anos ou por pessoa com deficiência. Na prática, porém, muitas grávidas e mães são mantidas atrás das grades em condições insalubres que aceleram seu adoecimento físico e mental.
Segundos dados da Diretoria de Pesquisas e Acesso à Justiça da DPRJ, mesmo com os requisitos legais para a prisão domiciliar, 27% das mulheres presas em flagrante, entre janeiro e abril do ano de 2021, tiveram a reclusão mantida após audiência de custódia. Entre as acusadas de furto, o índice sobe para 56%. Todas respondem por um crime que não envolve violência nem grave ameaça e são gestantes, lactantes ou têm filhos com menos de 12 anos de idade ou deficiência.
O encarceramento feminino no Brasil cresceu mais de 600% entre 2000 e 2016. Dessas, 74% são mães e 75% cometeram crimes sem violência (INFOPEN/2017). Cerca de 57% são negras e 32% são presas provisórias (INFOPEN/2019). “A prisão provisória tem sido usada para reforçar discursos morais e expropriar a dignidade, estima e ação dessas mulheres, que em muitos casos já vivenciavam violências interpessoais e institucionais com base em raça e gênero mesmo antes do cárcere”, alerta Lia Manso, coordenadora de Projetos em Criola.
As taxas de encarceramento são alarmantes de forma geral, sendo ainda mais agressivas quando se trata das mulheres. Em linhas gerais, de 2000 a 2019, o encarceramento no Brasil cresce 300%. Em relação às mulheres, cresce 600% de 2000 a 2016, e os números vem se mantendo na casa dos 37 mil desde então.
Ao longo da campanha, estão previstas mobilizações em parceria com organizações anti-cárcere para coleta de colaborações com itens de higiene para mulheres presas. As ações acontecem simultaneamente a atos na porta de penitenciárias nos estados do Acre, Pernambuco e Rio de Janeiro.
Podcast “Tô solta”
Mulheres negras que enfrentaram a realidade dentro das grades do sistema prisional são consideras sobreviventes. Os traumas e marcas da injustiça são permanentes em suas vidas e na de familiares. Também como parte da campanha “A dignidade não é provisória”, um grupo de 13 ativistas anti-cárcere apresenta suas histórias na série de podcast “Tô Solta”, produzida ao longo de oficinas com apoio de Criola.
Ao longo de três episódios, lançados semanalmente em plataformas de áudio (CriolaPOD! No Spotify) e no Facebook de Criola (@ongCriola), as mulheres falam em primeira pessoa sobre histórias de sobrevivência no cárcere, a vivência da maternidade e o peso da re-sentença enfrentada em suas vidas e na de seus familiares.
A campanha “A dignidade não é provisória” e o podcast “Tô Solta” têm o apoio do Fundo Brasil de Direitos Humanos. Os materiais estão disponíveis para compartilhamento neste link.
SOBRE CRIOLA
Criola é uma organização da sociedade civil com 30 anos de trajetória na defesa e promoção dos direitos das mulheres negras e na construção de uma sociedade onde os valores de justiça, equidade e solidariedade são fundamentais. Nesse percurso, Criola reafirma que a ação transformadora das mulheres negras cis e trans é essencial para o Bem Viver de toda a sociedade brasileira.