05/10/2022

Criola participa de ações internacionais em defesa dos direitos das mulheres negras

Em mais uma ação de incidência pelos direitos das mulheres negras, Criola estará presente na 52ª Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), entre os dias 5 a 7 de outubro, em Lima, no Peru, e que em 2022 tem como lema “Juntos contra a desigualdade e a discriminação”.

Paralelamente ao evento principal, a sociedade civil organiza uma série de debates. O Consórcio Latino-americano de Direitos Humanos promove no dia 5, às 19h de Brasília, a mesa “Fechamento de Espaços Cívicos: tendências regionais e ações para fortalecer a participação”, que deve reunir representantes da Guatemala, Nicaragua, Venezuela e a coordenadora geral de Criola, Lúcia Xavier, representando o Brasil. O debate pode ser acompanhado online confirmando sua presença aqui.

Tema que tem pautado Criola nos últimos anos, o fechamento de espaços cívicos se reflete também no aumento dos índices de violações dos direitos, em especial das mulheres negras. Mortalidade materna durante a pandemia da COVID-19, aumento de ameaças e ofensas, crescimento do feminicídio foram alguns dos indicadores que cresceram e vitimaram principalmente mulheres negras.

Em 2021, em preparação para a 51ª Assembleia da OEA, Lúcia destacou a importância deste debate. “O que tínhamos de políticas públicas ainda era insuficiente para tirar as mulheres negras e suas famílias da zona da fome e reorientar as próximas gerações. Se não pautarmos esse fechamento agora, voltaremos à estaca zero”, indicou.

Para mostrar o impacto desses dados, Criola, em conjunto com Geledés – Instituto da Mulher Negra e Instituto para Raça e Igualdade, tem se debruçado sobre o tema ao longo de 2021 e 2022, e até o fim do ano deve lançar um documento que reúna essas informações. Esses dados pautaram a delegação brasileira que esteve recentemente em Genebra, na Suíça, em preparação para a revisão do Brasil no 4º Ciclo da Revisão Periódica Universal (RPU) da ONU.

 

Preparação para a RPU

Desde os meses de julho e agosto, o Instituto Internacional sobre Raça, Igualdade e Direitos Humanos (Raça e Igualdade) vem promovendo uma série de encontros entre organizações da sociedade civil que trabalham com o tema de raça, gênero e orientação sexual no Brasil com Embaixadas em Brasília e suas respectivas Missões Permanentes, na cidade de Genebra, na Suíça. O debate é em razão da proximidade da revisão do Brasil no 4º Ciclo da Revisão Periódica Universal (RPU), um mecanismo desenvolvido pelo Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) para avaliar a situação de direitos humanos em cada um dos países-membros da ONU.

Os encontros em Genebra aconteceram entre o dia 29 de agosto e 02 de setembro, dos quais participaram o Grupo Conexão G de Cidadania LGBT de Favelas (RJ), representado pela atual diretora geral, Gilmara Cunha, mulher trans, líder comunitária e ativista de direitos humanos; Criola (RJ), com a presença de sua coordenadora programática, Mônica Sacramento; Instituto Marielle Franco (RJ) com sua diretora executiva, Anielle Franco; e Geledés – Instituto da Mulher Negra, representado por Nilza Iraci, coordenadora de Incidência Política. Por Raça e Igualdade, estiveram presentes o diretor executivo, Carlos Quesada; David Veloso, coordenador do Consórcio de Direitos Humanos; Gaia Hefti, oficial de advocacy em Genebra; e Leilane Reis, oficial de raça e gênero do Brasil.

Demonstrar no âmbito regional e internacional o atual quadro de violações dos direitos humanos no país, e conscientizar sobre a necessidade de recomendações mais direcionadas para a população negra, LGBTQIA+ e para os povos indígenas. Essa foram algumas das ações da delegação que tem participado ativamente na articulação perante esse mecanismo de direitos humanos através do envio de relatórios.

Tendo em conta este propósito, a agenda em Genebra representou uma continuidade do trabalho de incidência política realizada em Brasília, em julho. Na Suíça, foram cinco dias de reuniões com foco na visibilização do atual cenário sobre discriminação racial no Brasil, levando às Missões Permanentes, ao Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH), e aos especialistas independentes recomendações específicas sobre o tema.

O caminho de Brasília até as pré-sessões da RPU em Genebra tem por finalidade que as recomendações da delegação brasileira sejam acolhidas durante a revisão do Brasil na sessão da RPU que vai ocorrer no dia 14 de novembro, às 14h30 (Horário de Genebra), e às 9h30 (Horário de Brasília).

 

Próximos passos

A RPU é um mecanismo da ONU em que os Estados membros avaliam uns aos outros. Portanto, a incidência política da sociedade civil é primordial para visibilizar o cenário das violações de direitos humanos no Brasil e tentar influenciar que os Estados avaliadores acolham suas recomendações no processo de aferição. O Estado brasileiro também entregou seu relatório, no qual afirmou ter consultado a sociedade civil sobre a situação dos direitos humanos no país. Com isso, é realizada uma análise baseada nos avanços, retrocessos e boas práticas a partir de todas as informações recebidas e, por último, o Estado avaliado deve aplicar as recomendações dos seus pares.

Caso as recomendações da delegação brasileira sejam acolhidas e fomentadas pelos Estados partes durante a RPU, a tarefa seguinte é apresentá-las para o novo Governo que tomará posse em 2023, para que este tome conhecimento do trabalho de incidência política das organizações da sociedade civil e, ratificá-las e implementá-las no plano quadrienal de políticas públicas do Estado brasileiro. Desse modo, a sociedade civil tem a responsabilidade de monitorar o cumprimento da agenda em combate à discriminação racial outorgada na Revisão Periódica Universal da ONU.

Por fim, no intuito de colaborar com o mecanismo da Revisão Periódica Universal das Nações Unidas, as organizações brasileiras apoiadas por Raça e Igualdade propõem, entre outras, as seguintes recomendações direcionadas ao Estado Brasileiro:

I – garantir o acontecimento das investigações de crimes cometidos contra pessoas LGBTI em território de favela, possibilitando a coleta de dados públicos sobre tais crimes;

II –  tomar medidas urgentes para coibir e erradicar a violência policial em qualquer fase de atuação das polícias civis, militares e das forças armadas no cumprimento de missões em solo brasileiro.

III –  Recriar conselhos participativos e grupos colegiados que permitam a participação e controle social indígena na formulação, acompanhamento, implementação e avaliação das políticas indígenas do Estado brasileiro nas áreas de gestão territorial, educação, saúde e cultura, concomitantemente com o estabelecimento de programas e medidas que previnam e punam o racismo, a discriminação e a violência contra os povos indígenas e promovam a igualdade étnica e racial, a autonomia e o direito dos povos à diferença.

IV –  Conduzir a implementação do Plano Nacional de Proteção às Defensoras e Defensores de Direitos Humanos e institucionalização do Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos, Comunicadores e Ambientalistas (PPDDH) ampliando sua estrutura nos 26 estados do país e DF, estabelecendo orçamento, normativas e estratégias específicas para a recepção e acompanhamento de casos de mulheres Defensoras de Direitos Humanos negras, trans e travestis, representantes de povos e comunidades tradicionais, bem como indicadores para monitoramento e mecanismos judiciais de responsabilização de seus principais agentes violadores, com destaque para o uso da brutalidade policial e de grupos militarizados empregados para supressão de direitos e liberdades de  expressão, de associação, de crença, reunião e participação política no espaço cívico brasileiro.

V –  Assegurar o acesso aos serviços de saúde reprodutiva, garantindo inclusive a realização de abortos nas condições previstas na legislação vigente, sem entraves burocráticos e constrangimento às pessoas que gestam que buscam por atendimento, dando atenção especial para a situação das gestantes e parturientes negras, que sofrem com o impacto do racismo institucional na saúde materna.


Com informações do Raça e Igualdade. Foto: Pablo Suárez Bravo

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